O dirigente precisa avaliar com cuidado as repercussões do seu estilo sobre o caráter ou a maneira de ser da sua própria empresa. Ela é sua extensão, pois afinal “o fruto nunca cai longe da árvore”.

Tal pai, tal filho… Tal presidente, tal organização. A sua genética pessoal contamina naturalmente a genética da organização, e, assim, é comum uma transposição exagerada do DNA pessoal do dirigente para o desenvolvimento do DNA da organização. É preciso muita atenção para que a organização não se transforme num clone de seu presidente.

A afirmativa não pode, evidentemente, ser tomada ao pé da letra, porque o dirigente também é condicionado pela organização que pouco a pouco edifica, ou, mais propriamente, pela cultura organizacional que se forma em decorrência da interação das pessoas que a integram. Os avanços da identificação dos códigos genéticos em lugar de absolutizarem a preponderância exclusiva da hereditariedade reafirmam a influência significativa do ambiente numa espécie de darwinismo do desempenho organizacional.

O dirigente modela, forma, transforma e deforma a maneira de ser – o caráter – da organização. A escolha mesma dos auxiliares diretos e dos principais executivos da organização já deixa transparecer o seu estilo ou a sua influência, as repercussões de suas atitudes na construção da identidade da organização.

A organização reflete o estilo do presidente. O sistema de valores desse estilo se propaga do alto ao mais baixo escalão. O presidente define o caráter da organização.

Às vezes a organização pode regredir. Infelizmente, nesses casos, o “pai” é melhor do que o “filho”… E o “neto” pode ser pior que ambos. E é este que em geral assina o atestado de óbito da organização constituída pelo avô.

Muitos empreendedores cometem o erro de contratar preferencialmente pessoas que lhe são semelhantes. Pessoas que frequentaram as mesmas escolas, têm os mesmos hábitos, preferências ou hobbies, pertencem às mesmas igrejas ou sociedades ou até torcem pelo mesmo clube de futebol. O empreendedor não pode cair na armadilha de pensar que todos os líderes compartilham do mesmo perfil,têm traços próximos de personalidade ou as mesmas formas de negociar. Basta uma simples observação aos grandes líderes da história: alguns carismáticos, outros introvertidos. Outros tantos são joviais, durões ou sisudos. São arrogantes ou humildes, cultos ou intelectualmente medíocres. Não há um feitio comum em que todos os líderes sejam forjados. Portanto, ser ou não semelhante ao fundador vai depender das circunstâncias de cada situação e do processo histórico específico de cada organização.

Navegar é preciso, sim, no mar da vida. Mas, como a vida também é feita na terra, muitas vezes a caminhada se depara com um Rubicão. Lançar-se impulsivamente pode representar um suicídio, iniciando uma viagem sem retorno, deixando para traz dados recuperáveis de uma situação ainda não definitiva. Ficar à margem, sem arriscar a travessia, em nome de vãs e irrealizáveis ilusões significa perder-se irremediavelmente no passado e renunciar ao futuro. Nesse momento da crise de transição, a hora da verdade transforma-se em hora de decisão.

Chegando ao Rubicão, é preciso parar para pensar, refletir, pesar e sopesar, revisar e rever. Na verdade e pela verdade. Avaliado o quadro, chega à decisão. É ficar ou avançar. Transformando o passado no presente da travessia para o futuro da vida. Romper com o passado irrecuperável para construir um presente novo em função do futuro. E, aí, atravessar o Rubicão. Numa travessia definitiva. Que não têm volta, construindo um novo tempo.

O dirigente deve sempre se perguntar: “qual o estágio de desenvolvimento da minha empresa? Qual o meu estilo enquanto empresário? Em que direção e de que forma posso acelerar o desenvolvimento da minha organização, em especial mediante a reformulação dos aspectos disfuncionais do meu estilo?

Este é um difícil passo, porque representa uma atitude de abertura e de mudança, de reeducação de atitudes, hábitos e valores que nem sempre os dirigentes estão dispostos a assumir. A mais dolorosa das mudanças é a automudança, porque pressupõe inclusive a quebra da autoimagem e da autoilusão da indispensabilidade do fundador.

Experiência não é o que nos acontece, mas o que fazemos com o que nos acontece.

Não há quem rejeite a noção de que a experiência contém um potencial maravilhoso de aprendizagens. Todavia, negligenciamos cotidianamente a riqueza inesgotável da experiência. E por quê? Talvez porque aprendemos a repetir e não a repartir; aprendemos a rotinizar e não a inovar; aprendemos a individualizar e não a compartilhar, transacionar, transar. E este, é claro, não é um problema exclusivo do empresário de uma organização familiar, mas de todos os contemporâneos da sociedade do conhecimento e do mundo da competição globalizada.

O processo educacional regular nos ensina a estudar previamente a lição, fazer o dever de casa e só então se submeter aos testes de verificação das aprendizagens auferidas. A educação pela experiência é bem diferente – fazemos os testes e nos submetemos às provas “a priori” e só então aprendemos a partir das vivências ocorridas. A experiência não criticada é nula porque não enseja qualquer aprendizagem real. A vida às vezes nos prega peças, outras vezes nos surpreende, mas sempre nos ensina. Mas só aprendemos com a experiência examinada, criticada, compreendida e assimilada.

As organizações inteligentes aprendem muito da experiência alheia; as organizações medíocres aprendem por sua própria experiência, através do processo de ensaio, acerto e erro; as organizações ineptas simplesmente não aprendem e, por isso, sucumbem.

Para a maioria das pessoas, 10 anos de experiência são, em verdade, 10 vezes 1 ano. Ou serão 20 vezes seis meses de experiência? Isto porque em termos de acumulação de aprendizagens, de novas concepções e atitudes foram relevantes apenas os primeiros tempos. O tempo restante nada acrescentou, num desfiar constante de rotinas e repetições. É o exemplo do velho produto, marco inicial da firma. Ou o sistema de vendas que deu certo. Ou será aquele formulário que pessoalmente concebemos? Por que ainda existem? Força dos hábitos, das rotinas ou dos costumes? Devem de fato continuar? Por que insistir neles? Resistência à mudança ou acomodação?

Mas do que qualquer outra, a organização familiar precisa instalar um clima de mudança, de aprendizagem e de inovação. Se não o fizer, corre o sério risco de rotinizar-se, burocratizar-se, suicidar-se. Sem uma atitude de avaliação e crítica não há aprendizagem e mudança. A decorrência é a inércia e o imobilismo. E a primeira mudança na empresa familiar ocorre com a disposição psicológica de seu próprio fundador reconhecer a necessidade de mudar. A ordem do progresso é a mudança. Quem não consegue mudar a si mesmo não muda coisa alguma.

Como é que você planeja a sua sucessão? Ou você nem pensa nela?

Estaria você muito ocupado na lufa-lufa do dia a dia para gastar seu tempo com essas coisas?

Você já pensou que o seu filho ou filha, sobrinho ou genro possam estar pretendendo fazer outras coisas? Talvez não queiram, no fundo, sequer trabalhar com você ou mesmo sucedê-lo, talvez prefiram até mesmo trabalhar em áreas de atividades completamente distintas das que a sua organização atua. Talvez desejem apenas continuar recebendo as partes que lhes cabe na distribuição dos lucros e resultados.

Os seus familiares já pegaram tudo pronto, agora ficam só “mamando nas tetas”, “dormindo na sombra do boi”, não é assim que você os vê?

Será que você está convencido de que é cercado de incompetentes, portanto incapazes de substituí-lo? Ou não seria você a fonte de tanta incompetência? Falta de iniciativa? Desinteresse, descaso e incúria são causas ou consequências de seu estilo gerencial?

Ou você acha que seria realmente o mais antigo funcionário a solução ideal para substituí-lo? Será mesmo que nesses casos antiguidade é posto?

Você valoriza a prata da casa ou santo de casa não faz milagres? Não seria melhor a contratação de um executivo profissional para assumir os destinos de sua organização? Como incorporar sangue novo e verdadeiros talentos vocacionados à construção do futuro, assegurando-lhes condições de desenvolvimento e de adaptação criativa à atmosfera organizacional? Como instituir um clima de trabalho estimulante e participativo, e não de ameaças e punição? O que fazer? Recorrer ao outsourcing? Você julga que não deva escolher o seu sucessor porque ele tenderá a ser a sua própria cópia carbono esmaecida do vigor original? Ou você prefere mesmo alguém que possa ser o seu próprio clone?

O empreendedor precisa admitir que os seus colaboradores são capazes, ao menos potencialmente, de dirigir a sua organização na sua ausência. A premissa poderá parecer descabidamente elogiosa para a maioria dos empregados e bastante depreciativa da indispensabilidade do empreendedor. Ainda assim ela corresponde muito mais aos fatos demonstrados por organizações dinâmicas do que os equívocos cometidos por organizações que se defrontam inadequadamente com os problemas resultantes da crise de sucessão.

Como é que você trata os subordinados? Será que você dá instruções e toma decisões baseadas no binômio autoridade/obediência? E a administração participativa, como fica?

Em uma cultura do “manda quem pode, obedece quem tem juízo”, como pode haver iniciativa e criatividade?

Será que você vive se perguntando “por que ninguém aqui me apresenta uma boa ideia?” Ou será que você é daqueles que julga que “empregado não pensa, faz”. Será que você considera as reuniões para planejamento ou consultas uma pura perda de tempo? No entanto, às vezes, elas lhe servem como uma forma bastante rápida de comunicar as decisões que tomou, não é verdade?

Você já pensou que as reuniões que dirige parecem mais sessões de depoimentos nos tribunais do que reuniões de trabalho? Cada subordinado aguarda, apreensivo, o momento em que terá de defender ou justificar suas ações, geralmente sob severo interrogatório e ”broncas”.

Será que você costuma encerrar as reuniões com os seus funcionários perguntando-lhes: “Como poderei dirigir a empresa se vocês nunca me apontam os problemas que estão devorando os lucros”? “Eu tenho sempre que descobrir tudo sozinho”. E o silêncio de todos, o que significa?

Por que será que os seus funcionários têm essa atitude contemplativa? Desistiram de participar? Será apenas por incompetência? E o seu papel de educador? O que fazer para mudar tais circunstâncias?

Muitas organizações estipulam gratificações para o pessoal adicionalmente aos salários normais. Será que você concede essas gratificações de forma sigilosa, quase furtiva? E as razões para a concessão, quais são?

Será que não se forma um código entre os funcionários para fundamentar as suas decisões?

Apesar de a justificativa ser sempre o desempenho e o mérito pessoal, não será que você as concede como uma decorrência exclusiva de seu poder pessoal, benevolência ou reconhecimento por lealdade? Ou até mesmo por maior proximidade de você?

Barões e cortesões – a quem você mais beneficia? Aos próximos, assessores íntimos? Ou aos que estão na linha de frente, nos órgãos operacionais?

Não será que você com essa atitude acaba por instaurar o império da insegurança, do privilégio e da desconfiança? Alguns pensam: “aposto que ninguém ganhou mais do que eu”; outros pensam: “aposto que ninguém ganhou menos do que eu”.

Como é que você trata a divergência, o conflito ou a discordância?

Nas raras ocasiões em que um funcionário insiste em discordar, será que você tende a não admitir “tamanha ousadia” e indica a porta da rua ao atrevido? Será que você percebe o conflito como primo-irmão da insubordinação? É possível que a sua atitude desencoraje a abertura e a participação, recalcando os conflitos como alguém que pretendesse curar uma crise de tosse com esparadrapo na boca. O funcionário para de tossir, mas morre de asfixia. E assim a organização finalmente assegura o silêncio de todos com a paz dos cemitérios. Os seus colaboradores podem estar ainda vivos, mas psicologicamente mortos pela decretação da morte clínica da autonomia e da participação.

Como é que você expressa as suas concepções pessoais? Será que prefere não se expor? As suas fraquezas são trancadas a sete chaves, exceto para os “muito chegados”. Ou há aquela exceção para o velho amigo confidente? Claro! Jamais esse confidente, se for o caso, estará numa posição que amanhã possa ameaçá-lo.

Será que você não acaba perdendo a vantagem de compartilhar suas preocupações com terceiros? E porque não as revela? Os seus subordinados, sem saberem o que você está pensando, ficam impossibilitados de antecipar soluções para os problemas.

A consequência é que os subordinados acabam por assumir a tendência de “sempre jogar a bola prá cima porque o chefão decide” E aí você acaba empregado de seus funcionários, fazendo por e para eles o que eles deveriam fazer para e por você.

O estilo de liderança do dirigente numa organização familiar constitui um decisivo fator na modelagem do perfil da empresa. O pioneiro raçudo pode provocar grandes saltos de progresso, embasadas na sua determinação e obstinação e na sua intuição e instinto empresarial. Mas pode também provocar uma catástrofe com a velocidade de um foguete. Essas são a sua maior vantagem e a sua fraqueza fundamental. Você tende a confiar apenas em si mesmo – “só acredita no seu taco”, “é o dono da verdade”?

As descobertas da ciência do comportamento empresarial proporcionam alternativas mais eficazes aos estilos predominantemente utilizados pelos dirigentes das empresas familiares. O segredo consiste na capacidade de utilização do trabalho em equipe, reconhecendo que os recursos humanos são as variáveis não contabilizáveis dos balanços das empresas. São os recursos que manipulam todos os demais. São eles que detêm o capital intelectual das organizações nas suas diferentes facetas e dimensões.

A inteligência de sua empresa não está apenas nas marcas e patentes, máquinas e equipamentos, mas nas cabeças de seus colaboradores, quer sejam eles seus empregados ou integrantes de toda uma rede de relações que a sua organização possui, como investidores, clientes, fornecedores, competidores, agentes comunitários, autoridades governamentais etc. Como você trata o seu capital intelectual?

Os empreendedores costumam enfrentar desnecessariamente sozinhos os problemas mais extenuantes e graves das organizações que fundaram.

Eles precisam, mais do que tudo, de interlocutores para trocar ideias, criticar propostas, pensar diferentemente. Precisam aprender a dividir com eles a tensão nervosa para melhor explorar as questões em discussão e assim privilegiar com atenção o que de fato é importante e faz a diferença. Não necessitam nem dos “concordinos”, que concordam com tudo, nem de “líderes da oposição”, que são sempre “do contra”.

O que necessitam, em geral, é de um alter ego imparcial e sereno, que possa tomar parte ativa em seu diagnóstico para lancetar o âmago das questões em debate – alguém que possa estimular a procura de alternativas inovadoras e criativas, mas que compreenda que a decisão final é sempre do dirigente, que assume solitariamente os riscos das decisões tomadas.

A energia pode e deve ser mobilizada em torno dos sonhos organizacionais. As pessoas os identificam e os assumem, e por eles são motivadas. Assim, objetivos individuais e organizacionais entrelaçam-se de tal maneira que se confundem num só. Sob um estilo de gestão dinâmico e profissionalizado passa a ser viável o engajamento e o comprometimento de toda a organização na busca da excelência. O resultado da excelência organizacional é o aumento da produtividade e da lucratividade.

Para alcançar este patamar que transcende a sua própria existência, o empreendedor não pode apenas sonhar com o que deseja que a sua organização realize. É preciso que sonhe também como a eternizar após sua saída, como realizar a sua sucessão.

Muitos conceitos, ideias, valores e opções éticas legados pelo fundador perdurarão por muito tempo ainda. São a marca de sua cultura, a impressão digital de seu DNA.

Esse legado ideológico levou a organização a atingir o estágio em que você a deixa, e, por certo, parte substancialmente dele será útil à exploração de novos mercados, produtos e serviços. O seu maior legado, no entanto, será o que você for capaz de ensinar aos diferentes níveis da organização a sonhar por conta própria e a compartilhar sonhos comuns e coletivos. Cada colaborador não apenas contribuirá com a sua visão, conceitos e reflexões individuais como terá aprendido a interagir com os demais na busca do consenso e da excelência de desempenho. Participará de um sonho organizacional em permanente transformação, como aprenderá também a sonhar o seu próprio sonho.

Mas como chegar a esse estágio? O que é preciso ser realmente diferente do que vem sendo feito? Qual é o “Abra-te Sésamo” a ser utilizado por você?

É humanizar a organização, desenvolver um ambiente de trabalho de genuíno respeito à pessoa humana, reconhecer que os colaboradores são sempre capazes de fazer mais e melhor, de contribuir e de participar em atividades que lhes sejam realmente significativas e importantes.

As organizações não são apenas entidades econômicas vocacionadas para a busca incessante dos seus interesses materiais, como resultados de lucros e perdas, participação no mercado, ganhos de produtividade, redução de custos, dividendos a distribuir. As organizações existem porque existem pessoas que delas participam. São de seus comprometimentos, empenhos e dedicação que as organizações alcançam resultados. Assim, mais do que tudo, é da habilidade em ganhar e manter a confiança e a crença dos colaboradores no sonho organizacional que o empreendedor realmente será capaz de construir e eternizar a organização dos seus sonhos de fundador.

A história dos grandes impérios empresariais familiares exibe uma imensa incidência de morte junto com os seus fundadores. Mauá, Delmiro Gouveia, Matarazzo, Chateaubriand e milhares e milhares de empresas familiares (micro/pequenas/médias) todos os dias nascem e morrem no anonimato da burocracia impiedosa dos cartórios e juntas comerciais. A morte do fundador muitas vezes coincide com o início da morte da empresa.É preciso que você não seja o próximo a engrossar o lamentável, porém anônimo, registro necrológico das empresas brasileiras.

Adm. Wagner Siqueira
CRA-RJ nº 01-02903-7
Presidente