A empresa do ramo de tecnologia Three Square Market, localizada no Estado de Wisconsin – EUA, iniciou o implante de microchips em 50 funcionários no início de agosto. O dispositivo permite acesso a ambientes, informações, produtos etc., mas faz-se necessária a observação de outros aspectos organizacionais como, por exemplo, a Gestão de Recursos Humanos.

Nessa nova realidade, é preciso entender, principalmente, que as ‘as organizações não são lógicas, são psicológicas’, como afirma o Adm. Wagner Siqueira, conselheiro federal pelo Rio de Janeiro e presidente do Conselho Federal de Administração. As pessoas possuem características distintas e o bom andamento dos negócios depende da gestão desses agentes. Não há ‘fórmula de bolo’. É preciso compreender cada caso para a melhor tomada de decisão. Cabe ao profissional de Administração aprender a lidar com as diversas variáveis já apresentadas e as que poderão surgir com o avanço tecnológico.

Para a Adm. Renata Motta Vasconcellos, especialista em RH e conselheira suplente do CRA-RJ, é preciso muita atenção na hora de decidir sobre a utilização de tecnologias desse porte, pois os resultados de uma organização podem ser totalmente diferentes em relação às outras, uma vez que cada realidade é singular.

“Vale ressaltar que, neste caso, estamos falando de uma empresa de software, que já deve ter uma cultura voltada para inovações tecnológicas. Outra consideração importante é o fato de os funcionários terem se voluntariado, ou seja, desejado participar desse projeto”, destaca a Administradora.

Do ponto de vista estratégico, Vasconcellos destaca que depende muito de como tal tecnologia será aplicada, pois pode ser usada para o ‘bem’ ou para o ‘mal’. Assim, é necessária a sinergia entre todos os setores da empresa interessada nesse tipo de tecnologia para evitar impactos negativos, que prejudiquem as organizações e seus membros.  Um dos pontos ruins seria a possibilidade de invasão de privacidade, o que levaria a questão a litígios trabalhistas.

Para o advogado Marcelo Almeida, chefe da Assessoria Jurídica do CRA-RJ, os benefícios inerentes ao microchip são inegáveis, mas é preciso se atentar para as leis de cada país e para os direitos fundamentais e universais dos seres humanos. Ele defende que a implantação dessa tecnologia nas empresas brasileiras exige um cauteloso avanço na ‘legislação para ficar compatível com o momento tecnológico que a gente vive hoje’.

“No Brasil, a legislação em relação a isto ainda é muito amarrada. Se ficar configurado que, a partir do monitoramento desse chip. haja algum tipo de transtorno à dignidade da pessoa humana, ao livre exercício de suas atividades fora de sua atividade laboral pode, eventualmente, trazer a situação para esfera jurídica”, disse o advogado.

Se de um lado a legislação precisa ‘avançar’, por outro os cibercriminosos não estão preocupados com as leis vigente no Brasil e podem atacar os microchips remotamente, como a qualquer outro dispositivo, conforme explica Renato Marinho, chefe de pesquisa da Morphus Labs, empresa especializada em segurança da informação.

Para exemplificar, Marinho cita o exemplo de um marca-passo “inteligente” que, em 2013, apresentou vulnerabilidade a ataques remotos. O criminoso poderia, inclusive, desferir uma descarga maior do que a suportada pelo paciente e leva-lo a óbito.

“Trazendo para a realidade do chip de identificação do funcionário, uma vulnerabilidade na tecnologia poderia, por exemplo, permitir a leitura inadvertida das informações do equipamento bem como a reescrita dos dados nele contidos. Diferentemente de um dispositivo que usuário possa transportar ou usar, como um relógio, em um cenário como este, seria mais problemático para o usuário substituir ou, simplesmente, optar por não usar o aparelho vulnerável”, explicou o especialista.

Assim, a atenção redobrada à segurança contra o acesso indevido ao microchip deve ser ‘requisito básico exigido dos fabricantes’, diante de tantas possibilidades maliciosas.

Com tantas variáveis, a Adm. Renata Motta Vasconcellos defende que a mentalidade dos empresários brasileiros avançar com as novas tendências. Para ela há muita criatividade e competência nos altos executivos organizacionais, mas destaca que ‘ainda encontramos uma parcela de empresários despreparados para as questões envolvendo a gestão das empresas’. Daí, mais uma vez, a importância do envolvimento do profissional de RH em todo o processo.

“Os profissionais de RH geralmente levantam a bandeira de uma cultura voltada para mudanças, melhorias e inovações, acho que se futuramente essa tecnologia vier favorecer tanto as empresas quanto seus funcionários, estaremos preparados para isso”, expôs Vasconcellos.

Novas realidades, como as que o avanço tecnológico impõe, exigem competências diversas de empregadores e empregados, além de constante evolução do profissional de Administração. Aqui, o CRA-RJ se coloca como provedor de conteúdos atualizados sobre Gestão, disponíveis gratuitamente no site oficial, na CRA-RJ Play e na Rádio CRA-RJ.

Abaixo, você confere a entrevista completa feita com a Adm. Renata Motta Vasconcellos sobre a implantação dessa tecnologia e a gestão de pessoas nas organizações.

CRA-RJ: Como esse tipo de tecnologia aplicada impacta a gestão de pessoas?

Adm. Renata Vasconcellos: O impacto de uma inovação como esta, na gestão de pessoas, só poderá ser realmente verificado depois, pois cada organização é única e reage as mudanças de forma peculiar.

O que podemos é presumir que uma organização, como a Three Square Market, que se dispõe a tal inovação, tenha buscado medir os possíveis impactos na sua gestão.

Vale ressaltar que neste caso, estamos falando de uma empresa de software, que já tem uma cultura voltada para inovações tecnológicas. Outra consideração importante é o fato de os funcionários terem se voluntariado, ou seja, desejado participar desse projeto.

CRA-RJ: Além das possibilidades destacadas pela empresa, seria possível monitorar a localização do funcionário, por exemplo?

Adm. Renata Vasconcellos: Sem dúvida alguma isso é possível. Como a tecnologia NFC (sigla para Near Field Communication) permite a identificação de dispositivos em curto alcance, a mesma estrutura pode precisar a localização de um funcionário dentro da empresa, para simples abertura de porta e registro de ponto, bem como em outro local fora dela.

CRA-RJ: Isto seria um excesso de controle ou seria estratégico para as organizações?

Adm. Renata Vasconcellos: Depender da forma como o projeto é implementado. Como toda tecnologia, ela pode ser utilizada para o bem ou para o mal, o mundo tecnológico é suscetível a essas variações. Do mesmo jeito que temos o vírus de computador, com seu poder destrutivo, temos o antivírus, com seu objetivo de restabelecer a normalidade.

Consequentemente novas tecnologias precisam ser avaliadas com bastante cautela quanto aos impactos no ser humano, principalmente. Devemos medir seus limites de utilização para trazer benefícios as organizações sem ultrapassar a barreira do que possa ser considerado um excesso.

CRA-RJ: Além do incômodo, pode citar algum outro prejuízo causado por um possível monitoramento 24h/dia?

Adm. Renata Vasconcellos: O excesso de controle dessa forma, ou de outra qualquer, pode trazer prejuízos psíquicos e emocionais, coibindo a liberdade criativa, por exemplo, além de tornar a vida pessoal e profissional do funcionário um ‘curral eletrônico’.

CRA-RJ: Qual seria a melhor maneira de utilizar essa tecnologia para o benefício das organizações e dos funcionários?

Adm. Renata Vasconcellos: Inicialmente, entendo que devemos estipular todos os limites dessa tecnologia deixando claro aos funcionários seu alcance. Posteriormente, parece-me equilibrado que tal tecnologia seja opcional, permitindo a livre escolha e adesão por parte dos funcionários, resguardando assim o direito de opção sensível às pessoas com maior identificação com a tecnologia e as mais distantes desses mecanismos.

Além dos fatores organizacionais, não podemos esquecer dos fatores culturais da empresa, do ambiente/localização em que o funcionário habita, pois questões como cultura local e índice de violência podem interferir na utilização dessa tecnologia.

CRA-RJ: A atual mentalidade dos profissionais de RH e dos empresários brasileiros, na média, é compatível estrategicamente com essa tecnologia?

Adm. Renata Vasconcellos: Os profissionais de RH geralmente levantam a bandeira de uma cultura voltada para mudanças, melhorias e inovações. Então, acredito que, se futuramente essa tecnologia vier favorecer tanto empresas quanto funcionários, estaremos preparados para isso.

Com relação aos empresários brasileiros, é notório que possuem uma grande criatividade, porém ainda encontramos uma parcela despreparada para as questões envolvendo a gestão das empresas. Por esse motivo, sem uma regulamentação clara entendo ser bastante difícil o gerenciamento dessa tecnologia por parte dos empresários atualmente.

CRA-RJ: A tecnologia de implante de microchips subcutâneos para transações econômicas em baixa escala é relativamente antiga. A senhora acredita que a utilização em funcionários é uma tendência? Por quê?

Adm. Renata Vasconcellos: Algumas coisas são previsíveis, outras nem tanto. Acredito que se as organizações que optarem por esse tipo de tecnologia considerarem as questões que abordamos anteriormente e obtiverem sucesso em sua gestão, podemos estar sim, diante de uma tendência.

CRA-RJ: Como Administradora especialista em RH e psicanalista, qual a consideração magna a senhora tem sobre esta questão, relativamente nova na gestão de pessoas?

Adm. Renata Vasconcellos: Toda nova tecnologia deve ser estudada, testada e analisada com objetivo de estipular os parâmetros e limites para uma utilização benéfica e saudável para as organizações e seus funcionários. Não devemos impor tecnologias invasivas como esta ao corpo humano sem muita cautela, sob o risco de estarmos criando uma agressão que poderá ser insuportável ao funcionário, a qual não teremos como prever os possíveis danos.